O papel da escola da formação dos jovens (e de seus projetos de vida)

Formar jovens críticos, capazes de refletir sobre a realidade e nela atuarem, valorizar a vida, a cultura e os estudos como ferramentas do desenvolvimento individual e coletivo. Tudo isso é formação de valores e esse é o principal ponto na educação de crianças e adolescentes. Sim, este é um desafio bem desafiador (e sim, a redundância é proposital) porque estamos nos deparando com a necessidade emergente e definitiva de rever nosso conceito de educação e aplicar um novo jeito de, mais que ensinar, preparar para a vida.  

Uma pesquisa realizada pela Fundação Lemann, em 2014, com jovens e professores universitários e recém-ingressados no mercado de trabalho, apontou relatos sobre dificuldades frequentes de comunicação, ineficiência na metodologia de orientação profissional e educacional, e grande demanda por habilidades socioemocionais, como foco, autonomia, responsabilidade e proatividade. Desnecessário dizer que a escola não está formando bem o jovem para a vida.

Em O professor revolucionário, Thomas Burke afirma que as escolas estão preparando – e em muitos casos, preparando mal – os alunos com conhecimentos e habilidades que eles precisavam para viver nos dias de ontem, quando o que eles precisam, na verdade, é sair bem preparados e seguros para viver nos dias incertos de amanhã. Os estudantes estão mergulhados num mundo repleto de novidades que não existiam nem há 5 anos e de novas tecnologias que provavelmente já estarão obsoletas nos próximos cinco. A escola deixou de ser a única de fonte de informação, mas ela precisa se reinventar não para deixar principal a fonte de conhecimento.

Então, o ensino e o papel do professor não podem ser interpretados como uma transmissão de matérias, mas como uma busca e uma construção de saberes constantes em que o educador também aprende.

E isso se intensifica ainda mais quando entramos no campo da orientação vocacional, quando o jovem está a um passo da vida adulta e precisa entender seu papel na sociedade. Orientar o estudante a refletir sobre seus sonhos de vida, suas características individuais e, em um sentido mais amplo, traçar projetos, requer um trabalho voltado para o autoconhecimento. Um alinhamento entre a profissão escolhida e as habilidades de cada um precisa incluir o conhecimento sobre a estrutura dos cursos universitários e as atividades que ele, como profissional poderá realizar na carreira e sua contribuição com o desenvolvimento social com sua força de trabalho.

O máximo que vamos conseguir se quisermos estar a frente do jovem, é ficar atrás dele.  O caminho é ir junto. Dar voz. Ouvir. Aprender com ele. E, claro, ensinar. Porque, sim, ele quer aprender. Ele só precisa enxergar um sentido nas coisas e a sabedoria do educador é uma excelente ferramenta porque ela vem acompanhada de uma experiência de vida que vai ajudar o jovem a construir os seus próprios propósitos. O conhecimento, quando repartido, se multiplica.

Os professores devem, claro, transmitir o que sabem. Mas, mas o aluno do século XXI precisa de mais que conhecimento técnico; precisa de instrumentos para o futuro. O jovem de hoje é questionador e como ele busca sentido em tudo, é a maneira de ensinar que precisa mudar: a matéria que antes era transmitida de um jeito, precisa ser ensinada de forma a fazer parte da vida dele. Principalmente um assunto que não é tão legal, mas o leva o conhecer o que está ao seu redor, como os estudos do meio e envolvimento com questões sociais.

Todo mundo presta atenção naquilo que mais interessa e não é diferente com o adolescente. A sacada está em compreender o que mais interessa a ele e tornar isso interessante. Esse é o grande desafio dos educadores de hoje para formar cidadãos protagonistas, orgulhosos de quem são e de suas escolhas conscientes!

Só tem um jeito para isso: ingressar nesse mundo. Não há outra entrada. Nem outra saída.

 

Os Desafios do Novo Ensino Médio

Um dos grandes temas da atualidade quando se fala em educação é a medida provisória nº 746, de 2016, com as reformas que pretendem tornar mais flexível e atual o currículo dos jovens do Ensino Médio.

Em breves palavras, a reforma propõe o aumento da carga horária, das atuais 800 horas para 1000 e daí para 1400 horas anuais em prazo não definido, a reformulação do currículo com a divisão por áreas de conhecimento e uma flexibilização que permita aos estudantes escolher algumas disciplinas mais adaptadas às tendências individuais, sem descartar o curso das obrigatórias.

É um consenso a necessidade de melhorarmos a educação brasileira, e, por isso, é latente a necessidade de reforma, especialmente no Ensino Médio, fase em que o jovem está com o pé na vida adulta e a um passo de começar a contribuir com o desenvolvimento da sociedade.

Aqui não nos referimos apenas à qualidade do ensino tradicional, da aula de Matemática, da prova de Português ou do trabalho de História. O novo Ensino Médio é mais que isso porque a educação também o é. Hoje, existe uma imensa falta de conexão entre o currículo acadêmico (que precisa ser atualizado e aprimorado) com os anseios dos jovens da sociedade contemporânea.

Uma pesquisa feita em 2016 com mais de 130 mil jovens de 13 a 21 anos de todos os estados indicou que os alunos sentem falta de atividades extraclasse, artísticas e do uso de tecnologia. A geração de hoje é basicamente digital. E se o jovem vive nesse mundo, não faz sentido a escola continuar no modo analógico.

O aluno do Ensino Médio está construindo sua identidade, está se afirmando como um jovem adulto; então, tudo o que se refere a ele, lhe interessa. Por isso, por mais que aquela aula de Física seja considerada chata ou aquele livro de Literatura seja bem tedioso, existe um desejo por maiores responsabilidades e oportunidades de fazer escolhas. Ele querer atividades práticas interativas onde possa resolver problemas, que envolvam Física, que envolvam a produção textual  e tudo mais que o rodeia.

Entre os desejos dos estudante estão as assembleias, para que possam participar de decisões que lhes dizem respeito diretamente; desejam também ter apoio de especialistas como psicólogos, na própria escola, orientação profissional e para os estudos, aulas de culinária, costura e robótica, aulas interdisciplinares, querem participar de projetos sociais mediados pelas instituições educacionais, ações para cuidados com a natureza e muito incentivo à leitura. Eles querem voz. Nós precisamos dar essa voz a eles e torná-los os protagonistas que devem ser os alunos da escola do século XXI.

Há, porém, questões mais técnicas bem importantes a serem definidas e vencidas no caminho da implantação desse novo Ensino Médio, como a estagnada proficiência em Matemática e Língua Portuguesa – muitas vezes ainda no nível básico. E o impacto da ampliação da carga horária diante da necessidade de muitos jovens que precisam trabalhar, a formação dos professores e até mesmo formas de contratação desses profissionais em um sistema de ensino modular, com possibilidade de cursos de duração variável, entre tantos outros. Como alcançaremos a coerência do currículo, a articulação entre as áreas do conhecimento, a contextualização e diversificação das trajetórias formativas ainda é motivo para amplas discussões.

Mas de modo geral, o que podemos dizer hoje, ainda neste cenário atual tão incerto, é que a escola do século XXI, que aplica o Novo Ensino Médio, precisa quebrar paradigmas mais do que necessariamente seguir a medida provisória nº 746. Antes disso, precisa ser um espaço livre e acolhedor, com mais interação e menos paredes.